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O lado sombrio do consignado

20 de abril de 2019 Renata Fontes

Nessa semana, ouvimos uma frase que nos assustou muito: “Ué… Mas quem é que não tem um empréstimo consignado?”. Para os mais distraídos, é possível que tal pergunta não provocasse nenhum sentimento de estranheza. Em nosso caso, a questão soou como se escutássemos: “Quem é que não bebe um copo d’água durante o dia?”. E não deveria ser assim.

Bom… Traremos um pouco mais do contexto. Estamos em Brasília, a capital da República Federativa do Brasil. A cidade, em grande parte, é movida pelo Governo Federal. E, por esse motivo, o paraíso dos bancos quando se trata de conceder os famosos empréstimos consignados. Em 2016, para cada cinco habitantes do Distrito Federal, um era servidor público, conforme o Atlas do Estado Brasileiro divulgado pelo Ipea. Em nível nacional, essa relação era de um servidor público para 17 habitantes.

Algumas características do empréstimo consignado

Para quem não conhece, o consignado é uma modalidade de empréstimo em que o desconto da parcela é realizado diretamente na folha de pagamento do contratante, o que praticamente anula o risco de inadimplência ao qual os bancos geralmente estão expostos quando realizam operações de crédito. Podemos pensar assim: cada parcela do empréstimo funciona como um desconto mensal no contracheque, reduzindo o valor do salário líquido depositado na conta do funcionário.

Essa característica faz com que os juros praticados na modalidade sejam, em geral, mais baixos quando comparados com os juros cobrados nas demais operações de crédito disponíveis no mercado, principalmente quando se trata do parcelamento das faturas de cartão de crédito ou do cheque especial. De acordo com levantamento realizado pelo Banco Central na semana de 29/03 a 04/04/2019, as taxas médias de juros praticadas nos empréstimos consignados para os funcionários do setor público variavam de 1,18% a.m. a 5,47% a.m. Nesse mesmo período, as taxas de juros relativas ao rotativo do cartão de crédito para as pessoas físicas estavam concentradas no intervalo entre 3,50% a.m. e 25,04% a.m. Portanto, sob esse aspecto, não resta dúvida de que é preferível se endividar por meio do consignado.

Cuidado ao contratar um consignado, pois ele tira a sua autonomia!

Mas, como tudo na vida, existe um lado sombrio quando alguém contrata essa modalidade de empréstimo. Na medida em que deixamos a superfície, entendida nesse caso pela simples comparação entre as taxas de juros, nos deparamos com uma situação delicada. No consignado, podendo ou não, o contratante paga a parcela do empréstimo. Assim, quando você opta por contratar essa operação, você está perdendo a sua autonomia, já que não existe a possibilidade de deixar de pagar a parcela ou atrasar o seu pagamento. É como se você estivesse concordando com uma redução do seu salário por um prazo de até 96 meses. Em função disso, não deveria ser algo trivial de se fazer, mas, infelizmente, a realidade está desafiando essa nossa visão.

Temos nos deparado com muitas pessoas atingindo o limite máximo da remuneração que pode ser comprometida com empréstimos consignados, conhecido por margem consignável. Isso é preocupante! Faça uma conta rápida. Vamos considerar alguém que retém a alíquota máxima do IR, que é 27,5% (vamos esquecer a parcela a deduzir…). A margem consignável não pode ultrapassar 35% da remuneração. Nessa simulação, somando o IR e a margem consignável, já temos 62,5% do salário mensal comprometido. Isso significa que o saldo de 37,5% deverá ser suficiente para fazer frente aos compromissos recorrentes e aos gastos variáveis do mês. Se você não tem aptidão para malabarismos, pode ser impraticável.

Não contrate um consignado para antecipar seu consumo!

Ao final de 2018, mais de 17% das operações de crédito realizadas pelos cinco maiores bancos que atuam no país junto às pessoas físicas correspondiam a empréstimos consignados. Isso equivale a R$ 261 bilhões. Ah! Vale dizer que esse montante é 6,7% superior ao volume emprestado ao final de 2017. A carteira de empréstimo consignado perde em tamanho apenas para a de habitação.

Não estamos sugerindo, de forma alguma, que você nunca contrate um consignado. Mas estamos alertando para a importância de contrair essa dívida em situações específicas, de preferência em decorrência de imprevistos, embora o ideal é que você estivesse preparado para lidar com eles. Do contrário, ou melhor, se a contratação do consignado tiver como objetivo a antecipação do consumo ou o pagamento da sua fatura de cartão de crédito, é fundamental rever a sua atitude. Nossa experiência diz que as chances de você vir a ter problemas financeiros no futuro são grandes. E isso não é mau agouro!

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Categorias:Blog, Finanças pessoais
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